Despovoamento: Aldeias alentejanas e transmontanas resistem à morte anunciada
As aldeias do Alentejo e Trás-os-Montes sobrevivem ao passar dos anos e à morte dos seus habitantes mas os resistentes são cada vez menos e com menos confiança no futuro da terra.
Exemplo disso são os casos da aldeia do Arnal, em Vila Real, e Faleiros, no Alandroal. Duas terras com pouco mais de meia dúzia de moradores que resistem a sair e a mudar-se para zonas urbanas.
Na Aldeia de Faleiros, o inglês Peter Bernthal, de 62 anos, é um dos poucos que criou raízes porque quis e não porque nasceu no Alentejo.
“Num raio de 35 quilómetros, tenho bancos, hospital, lojas, supermercado, advogados. Tudo o que preciso para viver está aqui, no Alentejo”, diz. Com a mulher recuperou uma casa comprada em 2002 e até tem um turismo rural que recebe visitantes dos vários “confins” do mundo, mas não atrai nacionais: “Os únicos portugueses que cá vêm são amigos nossos”.
“Uma vez, telefonou um português e a primeira coisa que perguntou foi se havia televisão no quarto. E outro queria saber se tínhamos televisão por cabo. Eu disse que não”, relata a mulher Fernanda.
Agora, o casal gostava de ver um maior apoio ao turismo na região. “A última fábrica que abriu no Alandroal foi há 24 anos… O turismo é muito importante e podia dar trabalho à gente nova”, defende o inglês, apaixonado pela sua casa alentejana, com “tetos brancos com barrotes pretos de madeira” e “uma chaminé para nos sentarmos lá dentro”, que lhe evocam as “casas dos ricos” da sua região natal.
Mais a norte, Alberto da Cruz recorda os bailes, os gritos das crianças ou o barulho do gado que há uns anos animavam a aldeia transmontana de Arnal. Mas isso era “no antigamente”. Agora vivem apenas 15 pessoas nesta aldeia da serra do Alvão, localizada a cerca de 10 quilómetros da cidade de Vila Real.
Agora, aos 82 anos, Alberto da Cruz é uma testemunha do tempo. Desde que chegou viu a escola primária fechar as portas, viu morrer muitos vizinhos, enquanto outros emigraram à procura de melhores condições de vida, assistiu ao fim dos bailes e ao abandono dos terrenos agrícolas.
O silêncio tomou conta dos dias em Arnal. É preciso percorrer uma estrada estreita e íngreme para chegar ao topo da serra, que no inverno fica por inúmeras vezes isolada devido à neve ou ao nevoeiro.
“Não adianta bater à porta. A maior parte destas casas está abandonada ou fechada e só reabrem com a chegada dos emigrantes no verão”, referiu António Gouvinhas, 42 anos.
A batalha para manter vivas estas aldeias é assumida pelos presidentes de Junta mas a guerra está longe de ser ganha.
No Alandroal, o jovem Arlindo Dias, de 33 anos, está no primeiro mandato como presidente da junta de Freguesia e a meta é contrariar a “estagnação” a que a sua terra foi votada.
No interior do país, sobretudo quando se fecham escolas e outros serviços públicos, critica o autarca, trava-se uma “luta desigual contra o Estado”, que “quer acabar com as aldeias e concentrar as pessoas todas nas grandes cidades”.
“O interior está esquecido, mas, para o país ser de excelência, não podemos deixar morrer estes lugares e aldeias. É como uma árvore, que nasce por ter raízes. Até pode estar muito bonita, mas são as raízes que a alimentam e, se estas secam, mais tarde ou mais cedo a árvore morre”, sentencia.
No Arnal, para manter a “aldeia viva”, o presidente da Junta de Vila Marim, João Paulo Nóbrega, quer melhorar os acessos, levar até lá cima o saneamento básico e alterar as regras do Plano Diretor Municipal (PDM) para alargar a área de construção.
“São poucas as pessoas que lá vivem mas têm os mesmos direitos que os outros. Queremos também que mais ninguém se vá embora por não poder construir casa e a partir do verão vamos dar um incentivo financeiro a todos os bebés que nasçam na freguesia”, afirmou.
PLI/RRL
*** Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico ***
Lusa/Tudoben

